Durante o último feriado, o primeiro prolongado após o período de isolamento, chamaram atenção as imagens de diversos atrativos naturais lotados. Em diversas regiões e destinos ecoturísticos do país, pessoas se aglomeravam e nem todas seguiam as medidas de prevenção recomendadas pelas entidades referência em saúde. Mas o que é possível fazer para que estas cenas não se repitam? Como podemos tornar o turismo pós-pandemia mais seguro e sustentável a todos os envolvidos?

O ecoturismo e o turismo de aventura são vistos como atividade propícias nesse período. Em sua essência está, acima de tudo, a consciência ambiental e o baixo impacto à natureza, grupos reduzidos e variedade de atividades ao ar livre. Tudo isso permite, sim, um distanciamento seguro.

Mas é preciso, acima de tudo, a adoção de protocolos de prevenção à saúde. Aliado a isso, é necessário um posicionamento mais efetivo de gestores públicos e empresas quanto à implementação de uma cultura nova, para um novo perfil de turista, que busca momentos de relaxamento nessa retomada e flexibilização do turismo.

Conscientização e diversificação de produtos podem ser a saída

Para o diretor-presidente da Fundação de Turismo de Mato Grosso do Sul (Fundtur-MS) Bruno Wendling, por mais que procedimentos de segurança sejam adotados, não é uma situação tão simples de lidar.

“É quase impossível tentar controlar. Estão investindo em novas medidas, mas cabe a conscientização por parte dos turistas também, de procurar apenas empresas que adotem o selo de turismo responsável ou que observem a aplicação deles, distanciamento das mesas, profissionais com máscara, etc.”, comenta ele.

Ao mesmo tempo, Wendling diz que cabe às agências e empresas de turismo tentarem promover essa sensibilização, se posicionando e oferecendo um cardápio maior de possibilidades.

“Podemos diversificar ofertas, criar novos produtos e roteiros para serem ‘consumidos’ fora de feriados e alta temporada, para espalhar os turistas em outros atrativos. Dessa forma, todos saem ganhando: turistas podem descobrir novas experiências e ter uma vivência mais agradável, exclusiva, e de forma mais segura, com menos densidade e aglomeração”, explica.

Mestre em Turismo, coordenador de Segmentação da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Turismo (SEDETUR-RS), Álvaro Machado acredita que é preciso compreender o perfil desse “novo turista” para promover a conscientização.

Ele acredita que a pandemia serviu pra muita gente fazer uma série de análises e prognósticos. Mas, segundo ele, parece que houve um esgotamento desse modelo de “abre e fecha”, com relação às políticas de flexibilização de um modo geral no país.

“Houve esse desejo de sair e tentar fazer com que as coisas voltassem ao normal o mais rápido possível. Talvez esse trabalho de sensibilização das pessoas nesse momento tenha que ser intensificado. Tanto para a questão da segurança pessoal, com o uso de máscara e distanciamento, por exemplo, quanto para a questão da segurança física e ambiental”, sugere Álvaro.

Já Ion David, técnico em Turismo de Base Comunitária e sócio diretor da empresa Travessia Ecoturismo, associada à ABETA e localizada em Alto Paraíso de Goiás-GO, apesar desse descontrole, é possível reverter esse quadro.

“Acredito que esse feriado foi atípico, primeiro feriado com os destinos abertos, após o isolamento, embora esse movimento descontrolado possa causar severas consequências. Mas é possível reverter esse quadro, com estados e municípios fomentando as medidas de controle, articulações com as guardas civis e militares, vigilância sanitária, por exemplo”, comenta ele.

Novos protocolos no turismo pós-pandemia

Apesar de diversos destinos ficarem lotados durante o feriado, principalmente as praias, onde o controle é um pouco mais complexo, foi possível ver casos em que foram aplicadas as medidas de prevenção em atividades turísticas. Como em Gonçalves-MG, onde atua a Mantiqueira Ecoturismo, empresa associada à ABETA.

Guia de turismo e gerente da empresa especialista em atividades de 4×4 e caminhadas, Thaynara Siqueira Baumgartner implementou todos os protocolos do Manual de Boas Práticas Sanitárias, desenvolvido pela ABETA e disponibilizado para todas as empresas e profissionais de ecoturismo e turismo de aventura do país. Assim como diversas outras empresas associadas à ABETA, que têm em sua essência a preocupação com medidas de segurança e saúde, ela viu no Manual uma forma de se adequar a uma nova realidade. E essa implementação faz toda a diferença na experiência turística.

Foto: Raft Park Adventure
Foto: Raft Park Adventure

“A partir da adoção e implementação das medidas do protocolo, reduzimos nossa capacidade de atendimento a até 14 pessoas por dia. E a aceitação pela maior parte dos nossos clientes foi bem bacana. Notamos que eles se sentiram mais seguros e foi um fator determinante para mostrar a nossa seriedade na gestão do trabalho, pensando na segurança e saúde dos turistas”, explicou Thaynara.

Para ela, o posicionamento da ABETA à frente da criação desses manuais é fundamental, uma vez que ainda vemos municípios e turistas ainda não tão conscientizados quanto à importância de seguir novas orientações, especialmente nas atividades turísticas.

Essa visão de Thaynara também é reforçada por Ion David, que assim como ela colaborou com a criação do Manual de Boas Práticas Sanitárias da ABETA. “Acho que o papel de entidades como a ABETA é esse: fomentar um turismo sustentável, seguro e operações de forma ordenada. É incentivar também que o poder público tome as providências devidas para tentar controlar essa visitação descontrolada”.

Bruno Wendling e Álvaro Machado corroboram com a visão dos dois empresários associados à ABETA.

“A elaboração de protocolos tão detalhados como este, em todas as atividades de ecoturismo e turismo de aventura facilita para o empresário se adaptar e adotar novas medidas e processos em sua operação”, comentou Wendling.

Para Álvaro, “associações e entidades como a ABETA comprovam sua preocupação pelo setor, mostrando know-how para essa criação que entendo como um fruto de desejo e união, de sensibilização de práticas seguras associadas ao turismo. Dessa forma, todos conseguem sair ganhando, com responsabilidade, qualificação e profissionalização”.

 

Soluções de Bonito-MS podem servir de modelo

De acordo com Wengling, no último feriado de 7 de setembro a cidade de Bonito-MS teve um aumento de 110% de visitantes com relação ao mesmo período do ano passado.

“Pelo lado do mercado é bom, mas ficamos em alerta. Nos deixa mais tranquilos porque o estado já está fazendo uma série de protocolos e medidas de segurança. Junto com a secretaria, vamos monitorar todos os turistas que estiveram aqui, para mapear e identificar possíveis contágios, e se essa lotação tem relação com um potencial aumento de casos”, comentou.

Uma das soluções encontradas por Bonito-MS, um dos principais destinos de ecoturismo no Brasil, foi a adoção do voucher único. Ele é o principal instrumento de controle e ordenamento da atividade turística em na região. É um documento fiscal que garante o controle, on-line, do número de pessoas por atrativo turístico.

“Na nossa retomada, apenas adaptamos e diminuímos a capacidade de visitantes nos atrativos. Se o sistema chegar ao seu limite, as vendas travam. Essa adaptação não foi complexa por aqui, uma vez que já adotamos diversos protocolos de segurança nas atividades”, comenta Bruno.

O modelo é uma solução que diversos destinos e municípios poderiam adotar, mas demanda um trabalho em conjunto, organização dos atores locais, profissionalização e, acima de tudo, governança.

Seja como for, é importante estarmos atentos e trabalhando juntos, para tomar as medidas necessárias para que o turismo pós-pandemia seja o que todos nós esperamos.